Carta ao Presidente da Câmara Municipal de Sintra

11/08/2023

Exmo. Senhor,

Presidente da Câmara Municipal de Sintra,

Dr. Basílio Horta,

Em 2016, a Câmara que V.Exa. dirige apresentou publicamente um plano de mobilidade que foi duramente criticado por residentes e comerciantes. O plano não avançou. Em 2018, teve lugar nova apresentação pública a que se seguiu a proibição de circulação a não residentes nalgumas vias, a alteração de sentidos noutras tantas e a instalação de um parque de estacionamento na Cavaleira. A proibição a não residentes não foi acompanhada de sinalização e policiamento suficientes, as mudanças de sentidos de circulação não evitaram os engarrafamentos e o parque da Cavaleira não teve sucesso. 
No passado mês de Julho, sem qualquer comunicação prévia aos residentes, incluindo os que vivem na área agora vedada, entrou em funcionamento o controlo electrónico do trânsito na Vila Velha. Mas, como alertávamos há cinco anos, limitar a intervenção ao centro da Vila Velha desvia o problema para as artérias circundantes.

Os poucos que ainda residem na Vila, os que lá trabalham e, sobretudo, as multidões de turistas que por ali passeiam, sentirão certamente um ambiente menos poluído dentro da zona interdita, mas todos sofrem a poluição e os congestionamentos que enfrentam para lá chegar – que longe de melhorar, parecem acentuar-se ainda mais. 

Em toda a área circundante os engarrafamentos são diários, a poluição e o caos são constantes. 

Ou seja, ao longo dos últimos sete anos, a Câmara não foi capaz de traçar e pôr em prática uma estratégia eficaz de gestão da mobilidade no Centro Histórico de Sintra – que compreende não só a Vila como os bairros de São Pedro e Estefânia e a Serra. 

Os efeitos sobre os residentes e sobre os visitantes são cada vez mais gritantes.

As medidas que a QSintra preconiza desde 2018 e que tivemos ocasião de apresentar ao então vice-presidente da Câmara, permanecem necessárias ou são ainda mais prementes.

A realidade é que, ao fim de tantos anos, muito pouco mudou:

– Não há parques de estacionamento periféricos (anunciados várias vezes), nem mecanismos dissuasores da entrada de veículos em Sintra.  

– Nada mudou quanto ao estacionamento indisciplinado nos bairros do Centro Histórico e nas estradas da Serra.  

– A falta de policiamento permite veículos estacionados em frente a portas e portões, em contramão, em bermas marcadas com risca amarela, nos poucos passeios existentes e em bermas com mato e folhas secas com grande risco de incêndio.

– Continua-se a permitir o enxame de actividades ditas de animação turística, predadoras do ambiente e lesivas do valor deste sítio classificado como Património Mundial. 

– Nas vias vedadas a “veículos afectos à actividade de animação turística não pesados”, a proibição é constantemente desrespeitada e o policiamento insuficiente.

 Tuk-tuks e demais veículos de transporte de turistas param em qualquer lado para tomar passageiros, publicitar os seus serviços, mostrar uma vista. 

A serra continua a ser atravessada por “safaris” em caravanas de veículos altamente poluentes.

– Não se vê uma melhoria na rede de transportes públicos e continua por proibir a circulação de veículos que excedam o limite apropriado em determinadas estradas.

– Não se melhorou a sinalização desde as entradas em Sintra. Ainda esta semana, com a circulação na serra fechada devido ao risco de incêndio, só junto à Gandarinha o trânsito era barrado, sem existir antes qualquer informação em local visível que permitisse aos condutores optarem por alternativas, gerando o pandemónio que se viu.

– Não foram instaladas lombas para controlar velocidade onde tal se afigura necessário (por exemplo, na estrada de Monserrate, na Rua Conde de Sucena e nas zonas residenciais atravessadas pelo trânsito, em especial as zonas sem passeios para peões).  

– Não se incentivou a utilização de percursos pedonais, nem se cuidou de recuperar passeios e bermas das estradas (por exemplo, estrada de Monserrate) para viabilizar o seu uso pelos peões. 

Os pilaretes que foram espalhados por todo o lado dificultam ainda mais o uso pedonal (ou se circula na via com os automóveis ou na valeta com o lixo,  buracos e piso torto, e a passagem com um carrinho de bebé é frequentemente impossível); e esteticamente são deploráveis.

Face a esta realidade, que afecta diariamente  os que aqui residem e os turistas, com prejuízos graves para a qualidade de vida e para a imagem de Sintra, além do elevado risco em situações de emergência, estranha-se o teor das afirmações proferidas pela chefe da divisão de trânsito da Câmara no programa «Portugal em Directo» transmitido na RTP1 no passado dia 14 de Julho, em que essa representante camarária traça um cenário idílico, parecendo ignorar que a fila de trânsito chega frequentemente ao Ramalhão. 

As suas declarações são, aliás, contrariadas na dita reportagem por comerciantes e moradores que denunciam as diversas situações do seu quotidiano que não foram devidamente salvaguardadas, como, por exemplo, mecanismos que facilitem o acesso de assistências técnicas e de serviços de entregas domiciliárias ou de assistência familiar (ao que soubemos junto de alguns moradores, estas situações estarão a ser entretanto parcialmente consideradas mas até agora não foram divulgadas novas regras aplicáveis, e é de assinalar que as poucas dezenas de pessoas que ainda residem na Vila Velha são maioritariamente idosos).

É também preocupante, ao fim de tantos anos de promessas, ficar a saber  que “(…) a autarquia está a equacionar a construção de estacionamentos alternativos e periféricos com um sistema de transporte integrado(…)”.

Por tudo isto, apelamos a V.Ex. que faça uso dos dinheiros públicos que a autarquia arrecada para resolver de vez esta situação. 

Oiça os residentes, os comerciantes e os visitantes. Lance um concurso público internacional para selecionar uma equipa de peritos que desenhe uma estratégia eficiente de mobilidade; ou limite-se a seguir as recomendações da UNESCO quanto à mobilidade em áreas classificadas; ou estude o que foi feito em sítios que também sofreram os efeitos da saturação turística e os souberam conter,… E faça a devida alocação dos recursos necessários à concretização da mudança que se impõe na forma de gerir este território.

Sintra um lugar que é nosso, é um bom slogan mas infelizmente está longe da realidade de todos os dias. É urgente actuar. 

Gratos pela atenção,

Q Sintra – Em Defesa de um Sítio Único

Website Built with WordPress.com.

EM CIMA ↑