Pistas averiguação Gandarinha

Licenciamento da construção do Hotel Quinta da Gandarinha pela CMS

Pistas para averiguação

 

  1. Descrição do projecto

(in Plubituris, 9 Jan 2018)

O projecto de Sintra, de cinco estrelas, estará concluído em 2019. O palacete, conhecido como a Casa da Gandarinha, vai preservar a fachada original do edifício, onde estarão localizados diversos serviços. Os 100 quartos e outras facilidades, nomeadamente salas de congresso para 600 pessoas, ficarão situados nos dois “blocos contemporâneos”, em construção ao lado da estrutura principal do Turim Sintra Palace Hotel.

  1. Conclusões retiradas da análise do processo OB / 938 / 2003

O actual projecto de arquitectura entrou na CMS em Julho de 2003 e foi aprovado por Fernando Seara em Setembro de 2005, acabando por o processo ser deferido em Janeiro de 2011.

O processo foi longo e atribulado:

  • Dois chumbos por parte do IPPAR
  • A falta de estudos hidrogeológicos e de trânsito recomendados por técnicos da Câmara e pelo IPPAR
  • A falta de estudo e de acompanhamento arqueológico
  • E, acima de tudo – e apesar de nunca mencionada no processo -, a violação das regras do Plano de Urbanização de Sintra no que toca aos índices de ocupação do terreno e de área construída.

 

  1. Coeficiente de ocupação do solo e índice de construção

Relativamente ao coeficiente de ocupação do solo e índice de construção, o Departamento de Urbanismo afirma que «a proposta respeita praticamente os índices constantes no processo antecedente OB / 245 / 1998 que foi aprovado pela Câmara, e cuja justificação se encontra no parecer do Sr. Arqº Consultor de 19/06/98».

Ou seja, remete para a aprovação de uma outra proposta que não tinha sido aceite pelo IPPAR e que não respeita as disposições do Plano de Urbanização de Sintra.

No Plano de Urbanização de Sintra, que no próprio processo a Câmara refere ser um instrumento jurídico com efeito, a Quinta da Gandarinha está incluída na Zona das Quintas denominada Q3 e os Arts.11º e 12º são claros quanto aos índices de ocupação:

Ou seja, se o terreno tem 5 843m2, não pode ter uma ocupação superior a 291,15 m2 nem uma área bruta de construção superior a 584,3 m2 + 116,86 m2 de anexos, o que equivale a uma área bruta total de construção de 700,86 m2.

Ora, o que o projecto apresenta excede imensamente esses limites: a área total de ocupação é de 2 595 m2 e a área total de construção, excluindo estacionamento e área técnica, é de 5 555 m2 (antes, em 10 Nov 2004, o promotor ‘A Merendeira’ apresentara 5 847,5 m2 no Quadro de Áreas).

Apresenta ainda 4 pisos acima da cota da soleira.

Pode-se então perguntar se aqui não se aplica o Regime Jurídico de Urbanização e Edificação que refere no art. 68º a):

Artigo 68.º […] São nulas as licenças, as admissões de comunicações prévias, as autorizações de utilização e os pedidos de informação prévia previstos no presente decreto -lei que:

  1. Violem o disposto em plano municipal de ordenamento do território, plano especial de ordenamento do território, medidas preventivas ou licença ou comunicação prévia de loteamento em vigor;
  2. (…)

 

No capítulo Generalidades, o Regulamento do Plano de Urbanização prevê situações em que os índices de ocupação podem ser maiores. Não referindo que nessas excepções se inclui a construção de hotéis, há, porém um ‘etc.’ que poderia ser invocado para essa inclusão.

No entanto, a Memória Explicativa do mesmo Plano de Urbanização vem clarificar que as regras de ocupação do terreno definidas para as várias zonas são sempre aplicáveis à construção de hotéis.

No capítulo VIII – Previsões em vista de melhorar e de multiplicar as instalações de interesse público e de aumentar as possibilidades de alojamento da população flutuante – explicitam-se os seguintes pontos, com destaque para os pontos 5 e 6 que tratam exactamente da implantação de novos hotéis e dos índices de ocupação (págs 32 e 33 da Memória Explicativa):

Quanto aos hotéis e pensões (cujo número é necessário aumentar em Sintra) eis as bases que deveriam ser adoptadas para a sua criação:

  1. Eles devem, em princípio, ser situados na proximidade da Antiga Vila e das suas matas nacionais, ou na própria Antiga Vila. (…)
  2. Os hotéis devem ser construídos em terrenos vastos, com bonitas vistas panorâmicas e bem arborizados (excepção feita para os hotéis que foram instalados na Antiga Vila).
  3. Estas edificações não devem constituir grandes volumes de construção e não devem ser altas. O melhor será limitá-las à altura das outras edificações da zona onde elas se encontrarem. Com efeito, nas terras montanhosas, é a construção baixa que dá o melhor efeito. Em Sintra, sobretudo, é preciso velar para que quaisquer edifícios altos não venham desequilibrar o conjunto. (…)
  4. Seria de desejar que a maior parte destes novos estabelecimentos de Sintra fossem hotéis e pensões de preços médios ou mesmo modestos (…)
  5. Os novos hotéis e pensões podem ser construídos em todas as zonas de Sintra, salvo nas zonas industriais e nas zonas de habitação operárias, mas a superfície coberta do terreno do hotel e a altura do seu edifício não devem ir além dos respectivos máximos autorizados na zona em que o hotel deve ser situado.
  6. O efeito que todo o hotel com mais de 20 quartos produzirá no lugar escolhido para a sua localização, deve ser estudado previamente, no panorama do sítio. Em vista disto, o requerente deverá juntar, ao projecto submetido à apreciação da Câmara, um desenho perspectivo exacto deste edifício, colado no lugar preciso, numa fotografia panorâmica deste sítio. A autorização só poderá ser concedida se esta construção não estragar o efeito de conjunto. O projecto deverá ser examinado por um júri constituído por representantes da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, da Direcção Geral dos Serviços de Urbanização, da Direcção Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas, do Secretariado Nacional de Informação e da Municipalidade de Sintra.

(…)

 

  1. Estudos hidrogeológicos

A realização destes estudos, além de recomendados pelos técnicos e consultores da Câmara, é apresentada como condicionante na aprovação por parte do IPPAR em Junho de 2005: “O posterior desenvolvimento da intervenção deverá contemplar a realização dos estudos referidos [estudos hidrogeológicos] em face da sensibilidade e importância paisagística do local.”

Não terá assim existido uma “aprovação conclusiva” por parte do IPPAR, necessidade invocada um mês depois pelo Departamento de Urbanismo.

 

  1. Estudo de Trânsito

Ao contrário do que o técnico do Departamento de Urbanismo que analisa o projecto preconiza, o executivo municipal não apreciou qualquer proposta sobre questões de circulação e estacionamento, a formular pela Divisão de Trânsito, antes de qualquer decisão final quanto ao projecto.

 

  1. Consulta pública

O projecto não foi submetido a consulta pública.

O Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Concelho de Sintra estipula o seguinte:

Secção II – Situações Especiais Artigo 73º – Consulta pública

1 A aprovação ou admissão, pela Câmara Municipal, das operações de loteamento e operações urbanísticas, consideradas com significativa relevância urbanística, nos termos do presente Regulamento, é precedida de um período de consulta pública, qualquer que seja o uso predominante previsto para as construções a edificar, sempre que se verifique uma das seguintes condições:

  1. a) Dimensão superior a 4 hectares;
  2. b) O número de fogos resultantes da operação seja superior a 100, quando estiver em causa uma operação urbanística para fins exclusivamente habitacionais;
  3. c) Número de habitantes superior a 10% da população do aglomerado urbano em que se insere a pretensão, tendo por referência os dados oficiais do último censo geral da população.
  4. O procedimento de consulta pública aplica-se, com as devidas adaptações, às solicitações de alterações.
  5. A consulta pública é anunciada com uma antecedência mínima de 8 dias, a contar da data da receção do último dos pareceres, autorizações ou aprovações, emitidos pelas entidades externas ao Município ou do termo do prazo para a sua emissão, não podendo a sua duração ser inferior a 15 dias.
  6. O anúncio referido no número anterior deverá ser ainda publicitado através de edital, em dois jornais regionais e por aviso na II série do Diário da República, sendo os custos de publicação suportados pelo promotor da operação.
  7. A Câmara Municipal deverá acompanhar a publicação do anúncio referido nos números anteriores pela publicação, em local de destaque do site Camarário, de um aviso do início da consulta pública, disponibilizando on-line, sempre que a capacidade do sistema de suporte o permita, a documentação referente à mesma.
  8. (Revogado).

 

  1. Projecto de relevante interesse municipal

Não sabemos se, além do interesse municipal invocado para a dimensão do estacionamento, o projecto foi classificado como Projecto de Relevante Interesse Municipal. É provável que não, uma vez que o regulamento dos PRIM só foi estabelecido em 2016 (Aviso nº6185/ 2016 de 16 de Maio)

Seja como for, a própria CMS esclarece (Art. 10º do citado aviso) que:

«o reconhecimento de um projecto como PRIM não dispensa o integral cumprimento das normas legais e regulamentos aplicáveis, não sendo constitutivo de direitos».

E ainda: «quaisquer omissões e dúvidas, relativas à interpretação e aplicação do presente regulamento são resolvidas pelo Presidente da Câmara com observância da legislação em vigor» (Art.25º do mesmo aviso).

 

Pistas para averiguação– ver texto com dois documentos em anexo

 

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